quarta-feira, 2 de julho de 2008

O lugar dos milagres


77.

Eram muitas as saudades que sentia daquelas insistências, daquelas tentativas de armar ciladas entre países tão diferentes em crenças. A memória ganha contornos difusos com o passar do tempo. Era claro que estes esclarecimentos devidos ao rei Dom Sancho sobre investigações de contornos divinos valem uma eternidade. O lugar dos milagres habita no coração de cada um de nós. O lugar das infecções e dos sintomas de peste, com as maleitas e tosses associadas, que tantos receios traziam a todas as importantes figuras da corte e ao próprio rei, habitam nos seus cerebrais temores que surgem em impacientes pesadelos exaltados. Eram grandes os efeitos nocivos que aquelas terríveis mortes vinham causando nos últimos dias. Não existiam motivos aparentes para tanto fenecimento cerrar fileiras neste desesperado acto de contrição descoordenada. Seis padres desapareceram, seis quase santos homens morreram infectados ao cumprirem as suas santas tarefas de ajuda ao próximo. El Rei passava horas perdidas na noite tentando decifrar as respostas para estes intrigantes enigmas da humana existência. Subitamente lembrou-se do seu irmão bastardo dom Pedro Afonso, e de como vinham sendo trazidas informações a seu conhecimento dos interesses desse seu irmão em tomar posse dos sonhos de régios poderes. Ordens suas avançam já com o contingente que acompanha a cruzada a Constantinopla. Dar término a essas vontades, caso se tornem mais reais os propósitos de seu bastardo irmão. Dar logo ali conclusão naquela esperança que deseja iluminar esses intentos.
A noite escura dava pouco aconchego. As reais amantes não acalmam estes excessivos receios reais, e começam a ver as suas vontades terminarem, vezes sem conta, sem o desejado consolo do real afecto. O tempo passa tormentoso. Os assassinos de Raimundo estão à distância das vontades. Procuram, rigorosamente, novas estratégias para aplicar renovados banhos de sangue entre as cristãs almas do reino. As grávidas andam atormentadas pois duas delas apareceram esfaqueadas sem aparente ligação. Todos estes negros sinais atormentam nitidamente Dom Sancho que, ao beber, sempre contara com a constante reprovação da senhora sua esposa, Dulce de Berenguer. Apesar de já falecida, consegue atormentar-lhe estes seus esforços de esquecimento com as palavras que lhe deixara gravadas na memória.
- Apenas três coisas lhe digo, fiel esposo! Não sei porque o faz, não sei o que deseja obter ao fazê-lo e não sei porque se sente tão incapaz de deixar de o fazer.
Este diálogo terminava sempre com a rápida fuga da rainha da frente da imponente figura de seu esposo, sem que este lhe desse a respeitosa ordem para esse efeito. O domínio que a bebida exercia no rei era mais vigoroso e dava-lhe vómitos, tantas vezes acompanhados de tosse forte e especturação com sangue. Estes eram, seguramente, dos mais negros dias do reino. E a idade de El rei Dom Sancho a avançar sem reservas.
Os Templários aproximam-se agora da capital do reino. Estão à distância curta de dois dias, não mais. Trazem a esperança renovada pelas palavras e visões de Gonçalo de Arriconha. Estão com alento em dar conta desses assassinos que perseguem corajosamente desde que saíram de Idanha. O ânimo que transportam é sentido por todos como um verdadeiro valor de esperança. Desejam tudo isto poder partilhar com a nobre figura de El rei Dom Sancho I de Portugal.
Fernando Dias sabe bem a importância de que se reveste esta sua missão. Gonçalo de Arriconha já o pressagiou. Castro feito pajem assim o adivinhava.
A estrada passeava agora mais a direito por debaixo dos seus caminheiros!
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