sábado, 28 de junho de 2008

Pela calada da noite


74.


A noite escolheu descer sem ter dado aviso. Não avisou porque todos, El rei Dom Sancho inclusive, não precisavam dessa prática para denunciar os sentimentos de preocupação que pairavam pela corte. As muitas mortes pela fome e pela peste, os mais diversos prenúncios de estranhos ataques de animais raivosos que espreitam ansiosos pelas negras noites de lua nova e outros tantos acontecimentos que todos gostariam de ver desaparecer, como a morte de mais catorze padres que auxiliavam a população doente. Dir-se-ia que este era um ano que todos desejavam ver rapidamente terminado.
- Espero uma coisa de ti meu valoroso pajem! Espero que venhas dar a devida importância a estes últimos acontecimentos pois seguramente eles assim o merecem. Temos tido a companhia da Luz de Nosso Senhor que nos tem dado provas da importância extrema em estarmos sempre atentos aos sinais que nos vai colocando pelas sombras do caminho. Vais ter de viver com isto por toda a tua existência. Tudo vai acabar por ficar bem, com os intervalos sentidos em dor nas devidas alturas. É esta a essência da Sua vontade, feita de genialidade e surpreendente clarividência espiritual, para sempre reconquistada com o poder supremo do Amor e da Fé na Vida.
Os cavaleiros Templários de Fernando Dias dirigiam-se já com destino acertado para terras de Coimbra. Todas as divinas manipulações, transformadas nos acontecimentos dos últimos dias, deram origem a esta nova viagem com rumo à capital do reino. O novo e importantíssimo acompanhante que agora connosco faz caminho, a isso deu origem e necessidade. São de incalculável valor os dotes premonitórios de Gonçalo de Arriconha, dir-se-ia mesmo que impares a todos os níveis. Os índices de confiança e fé subiram só com a felicidade da sua jovem presença. Ao sermos iluminados com o seu contacto, se com ele exercitássemos o simples prazer da conversa, revelavam-se perante nós as mais resistentes formas de antecipação aos estranhos poderes da mente, enraizadas em fé e crenças Cristãs. Era assim tão intensa e poderosa a sua capacidade em provocar o espantamento e a verdadeira admiração.
Foram também estes os motivos pelos quais Fernando Dias não deu conta do destino a seguir pelos seus Templários, nem de que consigo transportaria Gonçalo de Arriconha até à presença de El rei Dom Sancho I de Portugal. Ao abade João, prior de Ferreira, deixou um simples recado de amizade e lembrança em palavras Templárias de estima e benquerença. Pela calada da noite se despediram de Ferreira, sem ruídos ou maiores agitações. Apenas o trote das montadas que dali se ia agora afastando dava à escura noite a indicação de que aquelas não seriam as mais correctas horas para caminhadas galopantes, ou até de qualquer outra natureza. Assim se orientavam os Templários pela escuridão feita abrigo, a caminho de terras mais a Sul, lá onde o Mondego pinta vales verdejantes com a bonita paleta das suas águas refrescantes.
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